2/03/2007

meu...teu...nosso(?)


As coisas que tu me dás,
tuas,
não te desfazes delas,
nem partilhamos o antes compartido
como despojos de guerra,
pontos de final...
As coisas que me dás,
tuas,
permanecem tão presentes
e possíveis
como nas estantes de teu quarto,
discos e livros,
como no traço de tua boca
este riso...
Porque as coisas que nos damos,
nossas,
antes, como agora,
nos dizem nós,
apertam nós,
e nunca partilharemos despojos
de nada...
Somos.
Seremos.


["coisa-feita", Luciana Cavalcanti. Recife, Rua do Hospício, em 09 de Janeiro de 2007]

Arte: De Chirico.

Advérbio














Nunca mais. Nunca mais saíra dali um lampejo de criatividade. Uma fagulha de vivacidade.
Jamais. "Jamais", dizia na frente do espelho.
E sentada, com as pernas cruzadas, bebia, cuidadosamente e aos goles, o café que fervia.
Prometia. Jurava que não.
Mas sabia que promessas suas eram sempre sem precisão.
Acreditava. Fingia ao máximo que valeria a pena.
Fato é que não sabia até onde e nem quando. Nunca passara bem nesses testes.
O negócio é que persistir era aquilo dali, sentar, meditar, misturar o cheiro da cafeína com a fumaça da nicotina.
E Esperar...





Zorieuq De.
22/XI/06

Baila



Cá vou, levando na valsa,
Os tempos e contratempos
Dessa dança estacionada
no ternário que nos une

Bailarina descobri
Que ninguém é inflexível
A ponto de não mudar
- pra cada dança, uma roupa

Ao fechar a tua porta
E ver o salão vazio
Eu senti nos bastidores
você por trás das coxias

Te espero no mesmo palco
E, quando fincares no chão,
Dançarei ao teu redor
Até que me dês a mão



Lena, novembro de 2006

Força Centrípeta

Nesse mundo tem de tudo...
Eu fico encantada...
Tem cara de pau...de todo tipo...de todo preço...a grosso e a varejo...
Tem sacana pra cada dia da semana...e esperto achando que engana...
Tem gente nociva que nem o leite corta a fama...
Tem cafajeste em toda esquina...chafurdando na lama...
Tem...
Nesse mundo tem que ter...
Porque tem que ser completo pra caber...
O bem e o mau...
Pra gente poder escolher!



Zorieuq De.
28/XII/06

O sonho da pequena Anna Crônica (ou a perna de Donna Baratinha)


Bons dias, boas tardes e noites para todos aqui, presentes ou não!
Para início de conversa me apresento desde já, pois reclamações não quero ouvir depois.
Abram bem os seus ouvidos que meu nome não apresento nem duas nem três, mas apenas uma vez...
Chamo-me Anna, sou uma Periplaneta americana, uma barata com doenças crônicas, demasiado humana e saibam que mesmo seus risos de contentamento, que o digam as moças, temem a minha humilde, porém avassaladora presença.
Toda minha ousadia de apresentar-me a vós faz-me lembrar de uma prima Alice, uma nobre mosquita que passou até pela vacina, mas isso é outra (hi) estória...
Sem mais delongas, sigo no meu canto para que os gentis tímpanos de vossas senhorias não cessem de bailar.
Não sou como minha prima, não só quero me alimentar, vivo muito bem imersa na volúpia e tinha até um namorado, mas aquele safado, sendo o único macho, outras baratas também ia procurar.
Vivia no arrego, n’uma casa de até bastante sossego, em minha toca a descansar. Minha rotina, afinal, não diferia da vida das minhas outras irmãs...
Após longas horas de sono, saíamos à noite e encontrávamos sempre uma casa de fartas sobras do jantar de nãoseiquem... A todo custo evitávamos os pés imensos que se nos vissem não tardavam em nos esmagar.
Uma bela noite, junto a nossas esperadas sobras de pão, notei muitas das minhas dançando e caindo em cima de algo líquido e de cheiro forte e de lá logo me afastei ainda meio zonza e encontrei um preto doce mas que tão logo secou devido a umas formigas desgraçadas contra as quais não podia lutar...
Fui então pra minha toca, mas ainda bastante tonta, errei o caminho cambaleante...
Riem de mim?! Tentem ter seis pernas depois de umas doses de Álcool Etílico Hidratado e Diluído 46° de nome Tubarão!!! Isso mesmo, eu sei ler... Diferente das outras me engracei pela comunicação dos homens e bastou-me um pouco de capricho para conseguir entendê-la.
Mas voltando ao assunto, havia errado de toca... Parei n’uma bem maior onde, deitada na cama, uma garota lia algo que me chamou a atenção. Ela era magra e bonita, das pernas bastante compridas e de cabelos tão extensos que pareciam não findar. Empurrei-me em direção a ela, corri, escondi, esgueirei com muito esforço meu contraste na parede clara até que... Fui avistada!
Ela... atônita... fitava meus contornos e eu delineava os seus...
Fiquei ali... estática... sabia bem do horror que meu simples aspecto causava, mas sem bem saber por quê... Afinal, sempre fui a mais bela de todas as minhas irmãs...
Foram tão longos os segundos que poderia senti-los trespassando minha escultural carapaça de quitina... Por fim, avistei a janela e tentei sair por uma suposta fresta, mas a verdade é que, ainda tonta, nada encontrei.
Quando achei que minha hora chegara, pois a garota se levantava, fiquei foi pasma, vejam o que aconteceu...
N’um movimento calmo a janela foi aberta e eu na ânsia de agradecer me demorei ainda um pouco, mas logo fugi, pois não sabia até quando minha aliada aquela moça seria... Mas mal consegui sair e a fresta fora fechada de forma tão abrupta e ignorante que me decepou uma perna, logo a mais bela...
- Pensei. Voltarei pela manhã e verei do que tratam aquelas incontáveis palavras...




08.01.2005
02:07
b.